Douglas S. Kim

I

Sem misericórdia e sem pestanejar, deportei
meus pensamentos para um lugar distante, solitário o suficiente
para que pudessem refletir sobre seus atos.
O homem, na sua infinita pretensão, decerto acreditou
ter criado uma palavra para cada coisa. Cada palavra uma
presa terrível, toda frase uma poderosa mandíbula.




II

Não adianta torturar as palavras, elas não confessam.




III

Não importa se permanecemos leais aos nossos fracassos
ou insatisfeitos com os nossos minúsculos heroísmos.
Um dos períodos mais intensos da minha vida
foi quando não quis fazer nada, não realizei nada.
Todas as possibilidades, essas odaliscas que ajudam
a concretizar os desejos, esfregavam seus véus
no meu rosto e dançavam com fervor.




IV

Cada dia é uma dedicatória diferente para quem
se mantém apartado da perpétua abulia humana,
apesar de sempre existir algo de familiar
na incapacidade alheia. Há quem acredite
que a nobreza do espírito mantém afastada de si
o campesinato da vulgaridade, mas o que distingue
um homem de outro é a capacidade de omitir.




V

Não são as palavras que envelhecem, são os dicionários.




VI

Quando percebo certo estado de espírito, indico-lhe
um lado e desapareço pelo outro. Sigo fielmente meu
instinto, pois ele sempre aponta o caminho mais difícil.
Por dentro, sou obsceno à vontade.



DOUGLAS S. KIM mora em São Paulo. Jubilado da FFLCH/USP, levou 30 anos para obter uma graduação. Trabalhou em vários empregos, não amealhou nada. No entanto, não tem do que reclamar. 

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