Ode a Obatalá

Cristina Judar

I

Que rendas têm sido tecidas sobre minha cabeça?
Quais vidas leves foram inventadas para minhas trajetórias, todas tão intrincadas?

Tenho persistido em um mar rígido. Enfrentado águas cortantes no asfalto.
Tento traçar rotas em meio à dor gerada pelas invisibilidades que hoje destroem os corpos.

II

Você, luz e sopro, entende do que falo? Ou minha palavra é densa, ígnea demais para alcançar os seus territórios de asas brancas?

Aqui só há terra dura e seca e a caminhada; uma insistência de passo após salto, baque e rombo para que, talvez, eu chegue a algum lugar.

III

Da textura dos alás virgens que me precedem, me volto para o além-tempo, consciente dos minutos que me compõem na exatidão da desumanidade que integro ̶ e da qual escolho me desvencilhar.

IV

Na canção das horas, que marés de nuvens e vapores mostrem os trilhos, os ninhos, os ovos marmóreos de uma vida revolucionada: láctea via, voluptuosa e doce estrada, marcada como o toque dos aguidavis que relatam sua respiração ao prosseguir novo e senhor, menino-grão, pai dos mundos. Êpa Babá.

arte: Arthur Cabral Braga


Cristina Judar escreveu as HQs Lina e Vermelho, Vivo, o livro de contos Roteiros para uma Vida Curta (Menção Honrosa - Prêmio SESC de Literatura 2014) e o romance Oito do Sete (finalista do Prêmio Jabuti 2018 e ganhador do Prêmio São Paulo de Literatura 2018). Co-organizou as antologias A Resistência dos Vaga-lumes e Pandemônio: nove narrativas entre São Paulo - Berlim.


Arthur Cabral Braga estuda Artes Visuais na UNESP, é iniciado em técnicas de desenho pela Ebac, e aluno e frequentador do ateliê de Rubens Matuck. 


Foto: Gustavo Cruz 

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